De: Pedro Figueiredo - "Na minha cidade não acontece nada"

Submetido por taf em Terça, 2014-03-18 02:28

1 - Na cidade de contas limpas, à moda do Porto, esta CMP começou o seu mandato privatizando / vendendo 21 milhões de euros de património público (está tudo bem, normal, tudo normal).

2 - A CMP reservou em 2013 300.000 euros (uau!) para a cultura em 2014, "para marcar a diferença" (os portuenses aceitam tudo).

3 - Há um bairro de habitação social com bonitas vistas de rio, com a sua demolição presa por indemnizações ("ainda maiores") caso não o demulam, enquadrado por contratos que ninguém conhece.

4 - 230 mil habitantes a viver por entre escombros de casas no séc. XXI, 200.000 no início do séc. XX, 350.000 em 1980/81.

5 - Foi por demais evidente que o futuro (2010) para os arquitectos e para a cidade ia ser, só podia ser, não havia como não o ser, "A" reabilitação...

6 - Eis que em 2013, ano 3 da troika, já emigraram dezenas de arquitectos, "onde estão os meus colegas?". ("Hão-de querer e não hão-de ter" ...arquitectos, engenheiros, know-how, "Escola do Porto", etc.)

7 - Não me posso esquecer de deitar fora os catálogos da Valadares (já era). (Na minha cidade não acontece nada. Guiamos turistas por entre os escombros da não-participação e esperamos o favor e a esmola do visitante estrangeiro.)

8 - Tenho que riscar o Sr. Guilherme da lista de empreiteiros (faliu) e o colega Arq.º Jacinto da lista de arquitectos (emigrou). (Onde está a multidão na Praça Carlos Alberto a receber o General Humberto Delgado?)

9 - As instituições da cidade repetem uma e outra vez, à nausea, uma e outra vez, e ainda uma e outra e outra vez ainda, os prémios aos arquitectos Siza e Souto de Moura - Quantos são? Vinte prémios? Estamos em crise? Não. Há toda uma não-política para a reabilitação urbana? Não. Todos os jovens e arquitectos emigraram? Não (sai mais um prémio para a mesa ali do canto). Por costume, tradição? Ou por costumeiro lambe-botismo da sociedade aos mesmos? E mais as conferências poéticas pela Ordem dos Arquitectos (mas não estamos em guerra?) (Titanic, mas já com o navio no fundo, uma e outra vez.)

10 - No ano em que o Bolhão faz 100 anos, 22 de não reabilitação, a CMP reserva zero euros do seu orçamento para o reabilitar. A biblioteca do Marquês permanece entaipada. (Os portuenses concordam, dizem que sim com a cabeça.)

11 - O Cinema Batalha continua fechado, sem-abrigo dormem cá fora, à porta (três), 4 hotéis construídos ou em construção na praça do mesmo nome. (Portuenses: tão mortos, tão "prós e contras", tão ano 3 da troika.)

12 - Viemos ao fundo após um colossal esforço para aumentarmos a dívida de Sócrates (90% do PIB, portanto é preciso chamar os senhores de fora) para a dívida de Passos (130% do PIB, portanto está tudo bem, mais um esforço, "reestruturar"? Para quê? Tão pouquinho para pagar e somos tão ricos, com salários tão altos.)

(Não-estado de graça, mas um estado de ausência nesta cidade, uma falta de sentido cívico geral, silêncio, a necessidade absoluta da revolução.)