De: Pedro Figueiredo - "As densidades e as pressões, modo de usar"

Submetido por taf em Sábado, 2010-06-26 23:42

Sobre o texto de Luís Ventura relativamente ao edifício de comércio, habitação e serviços de Manuel Correia Fernandes, arq.º em Vila Nova de Gaia vou alinhar uma análise crítica tendo em conta o que sei sobre o projecto que deu origem a este edifício.

Sobre o edifício:

  • Sei que esta proposta executada inclui uma torre “ao alto” e um edifício “ao baixo”. Este edifício em “éle” menoriza o impacto da altura da torre relativamente à Rua Álvares Cabral (V. N. de Gaia), pois a torre aparece recuada cumprindo a “já clássica” norma dos 45 graus. O edifício mais baixo materializa a continuação do alinhamento da rua pré-existente e a continuidade da altura (“cércea”) dominante. Como príncipio orientador de um projecto de alta densidade parece-me uma óptima solução que minimiza impactos, cumprindo no entanto a densidade que a Câmara permite e que o cliente quis – de certeza – que fosse a densidade máxima prevista, esgotando a capacidade construtiva do terreno.
  • O cliente foi a empresa construtora “Machado & Filhos”, ou seja, uma empresa com interesse pessoal quer na promoção, quer na construção - o que, não raras vezes, quer dizer “dificuldades acrescidas” para quem quer fazer um bom Projecto de Arquitectura. As empresas que constroem e promovem em simultâneo edifícios costumam “impingir” tipologias, materiais de construção de má qualidade e exigir as máximas densidades sempre que possível.
  • Tanto quanto sei, esta obra foi a evolução positiva de um “ante-projecto” que previa inicialmente “quatro - torres - quatro” de igual envergadura e da mesma dimensão que a torre efectivamente construída. Fica assim provada a sabedoria do Arq.º Correia Fernandes no jogo de volumes construído, que eliminou a densidade ainda mais “densa” que o promotor queria.
  • A densidade, neste caso, foi atenuada pela “arquitectura”. Pior seria sempre possível, e estou neste momento a pensar no Shopping do Bom Sucesso que ninguém neste país tem a coragem de demolir, apesar dos processos ganhos em tribunal pelo Arq.º Pulido Valente.
  • A Torre Eiffel também é densa e ninguém tem pensado em demoli-la ultimamente. Uma vez mais, mais importante que a densidade, o que importa analisar é a qualidade, na minha opinião. Este edifício - de entre os que o rodeiam no centro de Gaia - creio que foi “o possível nas circunstâncias”. As circunstâncias” são a Gaia dos anos 80/90 que conhecemos de passar na Avenida. O currículum do Arq.º Correia Fernandes é no entanto bem melhor que o de muitos arquitectos na Escola do Porto: aconselho a que se tome como exemplos da obra do Arquitecto Correia Fernandes a Assembleia Regional dos Açores (prémio SECIL) e as várias fases das Cooperativas SACHE – CETA em Aldoar.

Sobre o Arq.º Manuel Correia Fernandes, mais do que o Bom Arquitecto está a facto de ele ser – como poucos Arquitectos – um Arquitecto interveniente e politicamente activo; já que isso ainda é possível num país onde tantos Portugueses preferem abster-se do que a criticar ou construir “um país melhor”. Agradeço ao arquitecto Correia Fernandes o sentido crítico relativamente à Câmara do Porto. Isso tem sido uma lufada de ar fresco, perante o “unânime” Rui Rio. Tenho pena de o bairro SAAL da sua autoria para S. Pedro da Cova não ter sido construído. Mas as lutas continuam!

Abraço, Pedro Figueiredo
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Nota de TAF: Este projecto terá tido numa primeira fase a intervenção do Arq.º Correia Fernandes, mas a versão final (a que foi construída) é por ele rejeitada, recusando a sua autoria e por isso terá retirado o termo de responsabilidade. Ele sabe que tem A Baixa do Porto à disposição para os esclarecimentos que entender.