De: José Ferraz Alves - "A Regionalização promove a fixação de quadros. Eu entro pela porta da frente."

Submetido por taf em Quinta, 2009-11-12 13:51

Num dado momento do tempo, a questão da regionalização passa a ser eminentemente política, porque se trata de escolher, a partir de argumentos favoráveis e desfavoráveis associados a qualquer das opções, em função de aspectos técnicos, seguramente, mas também de valores, de ideais, de princípios: No fundo, escolhe-se no que se acredita. O que tem muita força!

No meu ponto de vista, quem defende a reorganização de freguesias e municípios, como processo de de baixo para cima, está a indiciar que defende a concentração. Porque é isso que está a propor. Eliminam-se uns senhores presidentes de junta de freguesia, racionaliza-se, cortam-se custos… Mas não é isto que temos andado a fazer, em todos os níveis da vida civil e empresarial, desde meados da década de 90?! Racionalizar de todo o país com o destino para Lisboa? Deixem-se os senhores Presidentes de Juntas de Freguesia em paz, os 1.250 euros que recebem mensalmente até ajudam à manutenção nalgumas aldeias de uma outra mercearia ou café e dos seus 2 ou 3 empregos. Faz-me recordar a expressão que ouvi hoje ao Prof. Júlio Machado Vaz: “A reunião do grupo de auto-motivação é na sexta-feira às 20h30. Por favor, entrem pela porta das traseiras.” Admitir-se que isto é um processo natural, do meu ponto de vista, é pura ingenuidade de bons corações. Não é, neste momento, por onde quero ir.

Quero é deixar bem claro que os adversários da regionalização vão contar com algo mais do que isto. Sobretudo numa altura em que chovem os chumbos do Tribunal de Contas da Comissão Europeia ao que a distribuição de fundos públicos tem andado a fazer por um país sem controlo. Quando não existe um poder efectivo, este acaba por ser tomado por quem não interessa. Este é já um dos princípios da Política de Cidades, todos os autarcas sabem o que acontece aos vazios, se não tomados, ao potenciar a sua ocupação por quem não interessa. A necessidade de rever o cadastro do território nacional, dos baldios, das terras abandonadas, de ganhos de escala para a exploração florestal e agrícola, não têm a ver com este desinteresse centralista sobre o resto do território? E isto não acaba por afectar a própria iniciativa privada? Não é por acaso que só se fala de um Novo Aeroporto para Lisboa e do TGV para Madrid, há decisores públicos e privados que do país só conhecem Lisboa, a auto-estrada para o Algarve e que se incomodam por esperar muito tempo na Portela em condições de conforto a que não estão habituados, sobretudo não é digno de se mostrar aos seus amigos de Londres, Paris, Bruxelas, Berlim. E, já agora, os meus amigos de Bragança que ainda acham que o resto do Norte, e o fantasma do Porto, será pior para eles do que Lisboa o é presentemente, o que têm a dizer sobre a necessidade de ser a própria Comissão Europeia a tentar por um travão ao que alguns poderes não eleitos andam a fazer aos nossos rios? O que dizer do Sr. Presidente do INAG, entidade reguladora do sector da água, dar razão parcial ao relatório da Comissão Europeia sobre o impacto negativo da política de barragens sobre a qualidade da água, mas mesmo assim tudo continua, porque há outros factores a considerar. Quais, criar empregos? Para carregar num botão e vigiar a manutenção de turbinas? E os senhores das quintas do Douro ainda não perceberam o impacto que irão sofrer por alteração aos níveis de humidificação? É óbvio que isto só pode acontecer por culpa do próprio Norte, de falta de vozes a chamar a atenção para os problemas e dos que, a partir do Norte, na sua pura ingenuidade, mais contribuem para divisões e acusações. Mais que não seja, percebam que estamos atentos, não andamos a dormir.

Tudo se joga, no terreno, a partir dos empregos e do nível de decisão que se lhes está atribuído, entendidos aqui como o valor dos salários e o número de equipas que se agregam aos vários nível de decisão. Ou seja, se os senhores Presidentes de Junta de Freguesia ganhassem 12.500 euros, já teriam uma equipa de três assessores e, em vez da mercearia e do café, a aldeia evoluiria para o supermercado e para o snack-bar. Julguei que não seria possível ainda mais sangria do Norte, mas ainda esta semana pude constatar mais uma situação de criação de um departamento em Lisboa, que é o ponto mais afastado de Espanha que temos no território nacional, precisamente para tratar deste mercado. Claro que os dois elementos da anterior equipa que trabalhavam no Porto não foram afectados a esta nova estrutura. E nós estamos a 1 hora de Vigo, por auto-via! Depois admirem-se da inevitabilidade do TGV, nem que seja para aqueles meninos irresponsáveis que acabaram por deixar uma senhora com filhos, desempregada no Porto, poderem calmamente e confortavelmente ir de Lisboa a Madrid. O preço da viagem não interessa, são custos a imputar à instituição de trabalho, depois corta-se um ou outro telemóvel ou despesa de combustível lá de cima. E nós aqui, a discutir inevitabilidades, lógicas, modelos… a insinuar que há interesses obscuros por detrás destes movimentos associativos. Isto tudo começa por coisas básicas. Há um decisor em Lisboa, um amigo próximo, empregado, a quem se tem de dar um dado posto de chefia, cria-se uma nova função, dá-se-lhe poder para fazer e propor, e… uma senhora no Porto fica no desemprego. São estes os interesses que me movem, a revolta contra a injustiça e contra a cegueira intelectual e moral de alguns.

Também a propósito da produtividade em Portugal ser 30% inferior a uma qualquer média e às palavras do Sr. Ministro Vieira da Silva quero aqui deixar uma nota. Sempre que alguém refere a falta de produtividade fico sempre a pensar que é possível apertar aquele parafuso mais rapidamente, controlar os defeituosos mais rapidamente, fazer mais bainhas de calças por dia, tricotar mais depressa… E a receita do Sr. Ministro foi também rápida e muito produtiva, há que formar os portugueses, cultivá-los, ensiná-los… a quê, por exemplo, a perder menos tempo em conversas sobre futebol e a resolver rapidamente as suas necessidades fisiológicas? Mas, Sr. Ministro, Srs. Empresários, a única produtividade que está em contínua falha em Portugal é precisamente a da gestão e de decisão, porque não é de tempo de trabalho que devemos falar mas de valor desse trabalho, de capacidade em que o converter em vendas de produtos e serviços de maior valor acrescentado e com maior riqueza para o país. Quando se continuam a discutir os 25 euros de aumento mensal apenas lhe posso dizer que a grande falta de produtividade no país é a de quem decide, orienta e tem de procurar mercados de maior valor, não é da rapidez em apertar parafusos ou cozer bainhas.

A Regionalização promove a fixação de quadros, de empregos, de salários, de indução de rendimento. É concreto, não discursos.

José Ferraz Alves
Rede Norte
Associação de Cidadãos do Porto