De: José Ferraz Alves - "PPP – Pequenos Projectos Possíveis: A importação de empreendedores, Caso 4"

Submetido por taf em Sexta, 2009-11-06 17:42

Em vez de Investimento Directo Estrangeiro, importar empreendedores

Têm saído, recentemente, notícias e comentários muito oportunos sobre a dificuldade em captar investimento estrangeiro para Portugal, que é um factor decisivo para o nosso desenvolvimento, nomeadamente o da Região Norte. Será de facto por aí?

O estudo anual da consultora Ernst and Young revela que o nosso país aparece em lugar 22 no ranking europeu de países, longe do topo liderado pelo Reino Unido, logo seguido da França, Alemanha e Espanha. Conclui que o Investimento Directo Estrangeiro - IDE - na Europa caracteriza-se por criar cada vez menos postos de trabalho, por mais concentrado nas componentes de investigação e já não na produção. A tendência do IDE em Portugal é de diminuição, sendo que grande parte dele é ainda de origem industrial, apesar do forte desenvolvimento das áreas de marketing e de vendas no país, nos últimos dez anos. Em termos de sectores, as energias renováveis, nomeadamente as eólicas, são o sector que mais se destaca em termos de captação de IDE. O sector das ciências da vida, nomeadamente a indústria farmacêutica, biotecnologia e os dispositivos médicos, apresenta potencial de atractividade.

Duas reflexões. Primeira, quem ganha com o IDE? Admitindo que a maior parte destes projectos acaba por ser apoiada por capitais financeiros portugueses e apoios comunitários? Segunda, como pode este efeito ser potenciado? Pela criação de uma cadeia empresarial em torno destes projectos mais estruturantes?

Isto para reconhecer que as apostas públicas que estão a ser feitas no domínio destes últimos sectores são, quanto a mim, correctas e sem alternativas. E aqui o Norte lidera claramente e vai ser o ponto de viragem no desenvolvimento económico do país. Para isso, é importante a excelência da investigação e da formação académica em Portugal, num contexto global, sendo possível captar cérebros de países europeus (e não só da China e Índia) para projectos, o que por si só já é um factor de diferenciação e de distinção (1.500 euros/mês é suficiente para captar em Portugal brilhantes cérebros, pagos a peso de ouro por outros países).

Mas, nesta cadeia de valor, considero que temos ainda uma falha grande: o deficit de empreendedorismo, dado que só conseguiremos resolver a médio prazo, pela focalização que o sistema de ensino está a fazer nestas vertentes. Deste modo, dado estar preocupado com o curto prazo, lanço aqui mais um projecto e uma causa, a da captação de empreendedores estrangeiros para a Região Norte.

Em 2006, num seminário com responsáveis do AICEP, coloquei as seguintes questões:

“Mais do que trabalhar com investimento externo, eu tenho trabalhado com investidores externos, porque de pessoas se trata. E essas pessoas procuram em Portugal sobretudo know-how, que na prática são pessoas, competentes. Essas pessoas que eu conheci, que estão a investir de forma espontânea em Portugal, não o fazem por causa de incentivos financeiros e fiscais. As minhas perguntas:

  • - porque não desfocalizar da oferta de incentivos mas procurar as vias para que essas pessoas gostem do nosso país e cá queiram investir?
  • - depois, temos de lhes dar esse know-how que eles procuram, que está a germinar nas nossas universidades, que são excelentes?
  • - o resto do dinheiro ficaria para os pequenos projectos de empresários nacionais, sob a figura do private equity, apoiando a 100% mas recolhendo o retorno para auto-sustentação do modelo de financiamento.

Basicamente, não acham que se tivermos muitas pequenas empresas, as grandes chegam, ou nascem, a seguir?“

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4.4.5.18 – A importação de empreendedores

Área de intervenção: Empreendedorismo

Factor despoletador da motivação: Constatação do deficit de assumpção de risco empresarial em Portugal; papel do talento e do empenho como factor de criação de riqueza

Meio: Criação de incentivos à instalação de empreendedores em Portugal

Objectivo: Criação de emprego e captação de riqueza no país

Mais importante do que atrair para Portugal investimento estrangeiro não seria atrair empreendedores que estão fora do país? E pessoas com alto nível de formação?

Em termos históricos, os grandes mestres já surfavam na onda da globalização há mais de 3 séculos. Por exemplo, a Suécia possuía muito minério de ferro, água para eixos motrizes, florestas para fazer carvão, mas não tinha mão-de-obra que dominasse a técnica da forja, da produção efectiva. O rei, então, mandou buscar centenas de famílias à Bélgica, os Valões. Moveleiros famosos da corte de Luís XIV foram importados por Catarina, a Grande, da Rússia. Essa importação de mestres garantiu a esses países distantes, frios, e até então pobres, produzir armas, ferramentas de trabalho, carroças, embarcações melhores do que os vizinhos, etc., o que resultou na conquista de enormes extensões de terras.

A Suécia dos anos 1750 ia do topo da Escandinávia até ao Norte da Itália e da Turquia. A Rússia, pouco depois, tinha a mesma extensão, chegando onde hoje é a Alemanha, no Ocidente e à Sibéria e Mongólia, no Oriente. Muitos artistas e cientistas, que tornaram possível o domínio de outros povos, eram estrangeiros, como Américo Vespúcio, italiano que trouxe terras americanas para a coroa espanhola; De Geer, belga que trouxe a mestria da forja para a Suécia; Leonardo da Vinci trouxe a anatomia e avançados cálculos de pontos para a França: discípulos de Américo trouxeram para a Espanha ouro e prata, o que permitiu a riqueza dos museus e prédios, e mais tarde centenas de hotéis que hoje atraem milhões de turistas; os discípulos de De Geer forjaram os canhões que conquistaram meia Europa, de onde trouxeram tesouros e os profissionais, que transformaram aquele minúsculo e pobre país numa grande potência industrial; os sucessores de Da Vinci fizeram as pontes que logo unificaram a França, permitindo uma eficiente rede de estradas e de canais, condição para a rápida expansão da sua agricultura.

A existência de bons profissionais era tão vital para o progresso das aldeias que ainda hoje corre uma história de que, numa vila da Noruega, onde haviam dois padeiros e um só talhante, esse cometeu um crime, sob a vista de um padeiro. Um teria uma pena de oito anos de prisão e o outro, apenas seis meses. Pois o juiz, para não prejudicar a aldeia, condenou o padeiro a oito anos e o talhante ficou com os seis meses, porque sem o único, a aldeia não conseguiria subsistir.

A propósito do empreendedorismo, no Ocidente rico, propõe-se apenas um tipo de emprego, assalariado, para um proprietário, uma empresa. Não promover nada para além do regime assalariado é terrivelmente limitado. Ver apenas o homem como um ser que procura apenas um ordenado é uma concepção muito limitada do ser humano, é uma forma de escravidão. Tal como refere Muhammad Yunus, o sector informal - aquele em que as pessoas inventam os seus próprios empregos, criam a sua actividade e praticam-na na rua, nos bairros, nos campos -, é visto sempre em termos depreciativos, nunca incentivado e, pelo contrário, obstruído com regulamentos, patentes, impostos, quando é precisamente onde os homens se mostram mais criativos, como sector individualizado. Quase sempre, os Governos não precisam de fazer nada, apenas de ter o cuidado de não asfixiar estes movimentos, que são actividades não assalariadas, auto-emprego e que respondem directamente à procura. Nos países ricos, a teoria dominante não considera estas actividades como económicas. Os actores sociais, os bancos, recusam-se a financiá-las e a apoiá-las, dado que só acreditam nas empresas formais, no regime assalariado.

O empreendedorismo exige o assumir de uma posição de desconforto e a colocação do seu Promotor numa situação de risco e de avaliação contínua, muitas vezes pelos menos preparados tecnicamente e pelos mais acomodados. É um exemplo de responsabilidade social, de colocação das suas capacidades na criação de valor e na oferta/criação de postos de trabalho para os que têm menos capacidade e competências para arriscar.